Silvio Santos vem aí!
Rosa Pena
“Quem sou eu no mundo? Essa indagação perplexa é o lugar-comum de cada história de gente". [Paulo Mendes Campos]
Eu pensei que não ia chorar mais, depois que reli Alice no País das Maravilhas pelo prisma do Paulo Mendes Campos. Aprendi que a realidade é louca e Quem sou eu no mundo tem que ter qualquer resposta, ainda que mentirosa. Uma que seja, e já dá pra levar a bendita vida adiante.
O Paulo também me ensinou que aqueles que suspiram e respiram tristezas são uns chatos, e que essa de dizer minha vida daria um romance serve para todos, pois qual é a vida que não termina em morte e qual é o romance que não tem morte?
Depressão virou démodé depois dos tarjas pretas, ninguém mais se afoga em lágrimas com tantas mensagens de auto-ajuda, todo mundo tem a solução para a solidão e pro sucesso. Sofrimento é coisa de antes da turma do Lair Ribeiro. Agora é só repetir:
— Eu sou feliz, pois tenho quase tudo que sempre quis.
Se não estiver convencido disso, repita mais cem vezes. Sem vergonha na cara e com um sorriso à Sílvio Santos. Se faltar algo na sua vida pense como a Poliana, melhor perder o esmalte do que perder a unha (essa é foda!) e coma uma pizza napolitana (essa é porque eu adoro!).
Por isso eu tinha quase certeza de que eu não ia ficar triste com mais uma perda, bastava ficar no espelho, repetindo que a vida é bela, que o triunfo virá a qualquer momento, que o Brad Pitt não se casou comigo nesta vida, mas nas próximas eu tenho chances.
Segundo a Glória Perez, na novela América, quando morremos, ganhamos o privilégio de conviver com a Intrépida Trupe no purgatório, passear aqui embaixo de vez em quando, dar uns beijinhos no gato escolhido. Logo, levamos vantagem, pois a gente curte os dois lados, enquanto aqui a trupe trepida pra cacete.
Não sei por que, então, ontem eu chorei rios, daqueles que salvariam a Amazônia. Realmente, não sei como consegui perder a medida da dor e ultrapassar a fronteira dela, se nem passaporte da infelicidade eu tenho. Entrei na fossa como ilegal ao pensar que a cada Natal diminui um lugar na mesa. Sempre faltaram cadeiras, agora sobram. Faltou-me modéstia na dor. Almejar que ela seja maior que a dos outros é típico dos chatos de plantão. Alice com crise de chatice?
Que venha a sentença pelo crime da saudade. Que ela seja a obrigatoriedade de um sorriso e que eu consiga achar que é blasfêmia pensar no passado. Por fim, que minha vida não valha um romance, valha apenas um conto, de preferência cômico.
Para que conste nele, coloquei o nome do Lair Ribeiro no rato solitário que mora na garagem do meu prédio. Ele precisa de companhia.
Será que Sílvio Santos vem aí?