Eu sou... Eu sou ...
Rosa Pena
Ontem almocei numa cantina, sozinha com o meu DNA, ao som de um prego melancólico dedilhando um acordeão. O restaurante estava lotado de pessoas que “vivem a vida", usando óculos escuros no ar-condicionado, bronzeamento artificial, camisa de viscose estampada. Lá também havia um grupo extenso de amigos, como se fosse uma excursão, rindo alto para mostrar muita alegria. Intuo que o temor de uma existência que não foi vivida plenamente os assuste (a sociedade instituiu os itens da felicidade), e que eles queiram a todo o custo provar aos outros e a própria vida:- Vivi sim!
Afinal de contas, a solidão, ainda que desejada, deixa-nos com um "eu" silencioso que se limita a olhar-nos nos olhos. Não há como afirmar que se foi um bem-aventurado sem ter tido pelo menos um namorado gatíssimo, um filho com um QI estupendo, uma viagem fantástica, uma vida profissional de relativo êxito, um Best- Seeler na cabeceira, um filme predileto que ganhou o Oscar, um carro do ano...
Pobre não entra nessa reflexão.
Não sei se virou obsessão aproveitar a vida pelo manual dos professores “Sorria ainda que sem boca” ou se até a felicidade entrou para o rol das competições. Eu sou mais feliz que você! Eu sou... Eu sou! ... Eu sou!