(foto: Rosa Pena e Nazi)
A invasão da paz
Rosa Pena
A água é pouca. Tem que cavar poço e dessalinizar. Peixe é muito.
Uma areia imensa. A vazante faz com que a água fique represada nos recifes. Eles chamam o fenômeno de “maré morta”. Sobram conchas, muitas, um sem fim delas. Lindas de doer.
Conheci Nazi catando-as. Eu caminhava pela praia e pegava algumas para minha neta.
Ela ofereceu-me um monte e depois caminhou comigo até a porta de sua casa. Aberta para todos a qualquer hora, mesmo sem ninguém a tomar conta. Lá não se fecha porta, nem se grita. Será que foi inspiração para o paraíso?
Encontrei uma infinidade de trabalhos maravilhosos de outros artesões do lugar e muitos feitos pela minha nova amiga, com escamas de peixe e conchas. Ainda que não fossem lindos, seriam pelo momento, mas eram realmente de uma beleza extraordinária. Abençoados.
Sem precisar provar nada a ninguém me convidou para entrar e me deu mangas tiradas do pé naquele instante junto com a paz do silêncio (eu sempre quis o silêncio das línguas que nada têm a dizer).
Mostrou-me com sua serenidade o encanto que a vida tem, com pouco no bolso e muito na alma. Fui à casa de Nazi todos os dias em que estive em São Miguel dos Milagres.
No último dia pedi uma foto e ela me ofereceu um pente que emprestava a todas que ali passavam.
O pente limpinho. Meu coração também.