É de manhãzinha do dia trinta e um de dezembro. Abro as janelas e já sinto um cheiro de assado que atropela o perfume das gardênias que meu vizinho de varanda audaciosamente plantou e elas vingaram. O sol carrega tanto na luz que meus olhos tropeçam na imagem do céu. Eu, com minha xícara de café, dispenso o filtro pra deixar a pele arder provando-me que estou viva.
Solto o pensamento e concluo que deveria, como defesa, esquecer esse lance de término de ano, coisa que tenho tentado violentamente. As rabanadas (gardênias) azuis, o lombo cor-de-rosa, os damascos em tons de laranja não fazem parte do arco-íris que quero salvar do naufrágio dos fogos de artifício. Saboreio a luz que se espalha sobre a cidade e tento serenar a enchente de meus olhos. Quero silêncio total em minha alma.
“Navegar é preciso”, mas hoje eu quero estar à margem.
Rosa Pena
Enviado por Rosa Pena em 31/12/2013
Alterado em 02/01/2014