Desenho de Tiago Leal
Bar
Rosa Pena


Um pianista tocava uma música inespecífica, ninguém ouvia mesmo, para que se esforçar?

Ele chegou com um ar cansado, sentou-se sem escolha e pediu um vinho tinto. Os cabelos maravilhosamente brancos, a testa franzida acentuando as rugas em andamento, nos lábios um sorriso  triste, mas bem dele, sem disfarce algum.

Deu um gole na bebida, dois, três, e por fim afogou-se inteiro nela. Os olhos eram de uma solidão gritante. Pediu ao garçom que entregasse ao pianista um papel onde estava escrito Naquela Mesa de Sérgio Bittencourt e que trouxesse outra garrafa de vinho.

Veio mais uma e mais outras. Na quarta garrafa, o gerente com um crucifixo de ouro no pescoço, preocupado com o porre de um homem com o ar tão distinto, aconselhou-o a parar e afirmou que a fé cura qualquer dor.

Ele olhou para o homem, para sua apreensão e disse:

Um brinde a vida que segue apesar de tristezas antigas, solidões, frases não ditas, desistências e cansaço! Quem se diz afortunado o tempo todo mente. Depois do porre quem sabe a cabeça não volta ao antes e com ela as cores, o riso, o arco-íris, o girassol, a morena d' angola...

Com sua licença Pessoa! Olha que as religiões todas não ensinam mais que uma mesa de bar.*



 
* Inspiração: Tabacaria/Fernando Pessoa(Álvaro de Campos)
 

Rosa Pena
Enviado por Rosa Pena em 15/05/2012
Alterado em 16/05/2012
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