Paris, Copacabana

                        Rosa Pena


Ele já estava lá, sentado bem próximo da porta, com um drink.
Quando ela entrou foi brindada com seu sorriso, uma obra de arte. O efeito, que sempre lhe causa essa boca sorridente, é semelhante ao que sentiu quando subiu as escadas do metrô em Barcelona e deu de cara com a grandiosidade da catedral "Sagrada Família" de Gaudí. Socorro! Brota bobeira até na alma. É muito frisson diante do belo. Ela venera a arte criadora do povo da Catalunha. Picasso, Miró, Dalí... Ele, brasileiro, aqui.


Abraçaram-se forte, com muito carinho, afinação (sempre estiveram afinados), cumplicidade de delírios e uma imensa delicadeza. Lembrou do Caetano Veloso: “Um amor assim delicado você pega e despreza...”

Continuaram a conversar, jamais precisaram começar, sobre sonhos e fantasmas, blues e gastronomia, cinema e desilusões, pousos e decolagens, entre batatinhas, Bloody Mary, caipirinhas, pistache, Martini sem cereja.
 Pena! Ela gosta muito de cerejas. Da cor e do sabor.

O piano ao fundo tocava velhos conhecidos e ela acariciava o rosto áspero doce para conferir “in loco'” o esmero da escolha de seu coração. Falou-se de tudo um muito! Clint Eastwood praticamente sentou-se com eles para contar histórias. Ah! As fabulosas do Thelonious Monk ou Sobre Meninos e Lobos...

Foram confirmadas 80% das preferências gêmeas  deles.

Quando o pianista deu os primeiros acordes de Misty eles já estavam chegando à França. Lógico que April Love seria a  trilha sonora mais adequada para a ocasião. Voilà! Primavera em Paris é linda. De mãos dadas atravessaram o Arco do Triunfo e de marcha ào túnel do tempo.

Ambos adolesceram naquela tarde.

Perto das dezenove horas percebeu que era hora de suas fantasias pousarem. Ouviu os avisos da vida para colocar seu juízo no lugar e apertar o coração. Carimbou seu passaporte com um selinho e percebeu finalmente que estava na Rua Barata Ribeiro. Nem Paris, Texas. Legítima Copacabana.

E pensar que a menos de meia hora estavam correndo em plena Champs-Élysées! Afinal o pianista tocou Misty ou o Último Tango em Paris?

Danado gosto de adeus às ilusões. Ela não suporta despedidas.

Nem da cor, nem do sabor.
Rosa Pena
Enviado por Rosa Pena em 03/05/2010
Alterado em 07/05/2010
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