Tá faltando ouvir wave!
Rosa Pena
"Fundamental é mesmo o amor
é impossível ser feliz sozinho"
Wave/ Tom Jobim
A arrogância não foi vitoriosa na última copa do mundo. O capitão afundou com o navio. Babou, ferrou, já era. Liderar é para quem sabe que ninguém está acima do bem e do mal. É saber que o eu sozinho não vai muito longe, que equipe é conjunto de raça e coração, que uma andorinha não faz verão nem na Terra do Fogo, que para fazer tintim é preciso no mínimo um par de mãos. Enquanto a educação anda em falta, o ta se achando excede. Ah! Que lástima perceber que a elegância atualmente está em outra dimensão, que tantos são devotos de si próprios, adorando-se em seus altares pré-fabricados com aglomerados de asneiras, considerando-se donos de um império de merda criados em delírios sem nem a ajuda de Deus.
Esta semana eu lembrei novamente do filme Vinicius, onde a vida dele é contada pelos amigos, Miguel Faria Jr (direção e roteiro) e Susana de Moraes (produtora) reuniram a dedo os ótimos que se acham apenas normais como nós. O depoimento do Chico Buarque martelou em minha cabeça e explodiu ontem na final da Copa. Chico diz com tanta naturalidade que Vinicius criava mil movimentos e depois os deixava evoluir de acordo com o pensamento de todos, dividia seu talento, aliás, mais bem mais, afirmava que aprendia com os novos que vinham por aí sem ambição alguma que não fosse sorrir com ele.Vinicius em muitos momentos abriu mão de suas iniciativas, pois nunca as viu como só suas, nunca se sentiu chefe de nada, até porque penso eu em meu anônimo viver-De que adianta ser dono da lua e impor mil regras às estrelas?
Este foi um dos fatores que fez a bossa nova vingar, sem donos e sem autoritarismo, como afirma Toquinho, Carlinhos Lyra, Edu Lobo e mais tantos outros que se juntaram à lua crescente de Vinicius e Tom e viraram maravilhosas estrelas, não cadentes, muito menos decadentes, pois fala sério, existe coisa mais fora de moda do que a prepotência? Ah barrigudos de ambição! Será que aprenderam um pouquinho ontem que está na hora de fazerem uma lipoaspiração nas vaidades? Nossa seleção tão talentosa morreu na individualidade, João Gilberto está esquecido pelo público de tão perfeito as regras de um diapasão, Zidane se danou e o povo viu a banda passar sem cantar coisas de amor.
Loucura minha tentar fazer um paralelo entre esporte, música e qualquer outra atividade conjunta? Talvez eu seja uma porra louca, espécime em extinção como o Chico Buarque também afirma no filme, mas todo e qualquer movimento precisa de disciplina sim, mas uma disciplina educada e amorosa, assim como tudo na vida precisa de emoção, nada vinga se possuído pelo orgulho imbecil que eu sou mais eu.
A humanidade anda saturada de ver e receber porrada, seja física, seja verbal, seja musical. Ferreira Gullar garante que Vinícius de Moraes viveu para ensinar felicidade. Chico avisa que não consegue ver Vinícius no mundo atual, onde o coletivo morreu. A copa do mundo me leva a pensar muitíssimo nisso. Jogadores se machucando, empurrando com a barriga o jogo para cobrança de pênaltis. Quer coisa mais individualista para uma atividade conjunta?
A cabeçada do Zidane doeu até aqui, mas o que ele deve ter ouvido também deve ter doído bastante nele, ao ponto dele jogar seu momento de glória pela janela da raiva. Novamente venceu o desafeto. Pena a gente ter assistido a uma Copa do Mundo como se assiste ao João Gilberto, a qualquer momento o show pode parar, pois não é feito para nós, subalternos dos chefões da altivez, recheio supremo da pizza criada em devaneios absolutistas. Estranho que só recheio não vinga sem massa.
Não existe tempero gostoso sem afeto. O mundo perdeu o sabor. Destemperou na estupidez do eu me garanto.Tá faltando ouvir wave!
registrado na BN
Rosa Pena
Enviado por Rosa Pena em 10/07/2006
Alterado em 26/09/2008