Minha outra banda
Rosa Pena
Subitamente a banda me chamou aos gritos. Eu já não tinha mais consciência que estava com a vida tão à toa, como se a existência permitisse replay, como se eu pudesse a qualquer momento voltar e inserir anexos nos momentos em que ela passou ligeira, totalmente desformatada, despida, despenteada, as unhas malfeitas sem sequer ter o disfarce de um esmalte qualquer. Quantas meninas sonhadoras foram sufocadas pela minha ânsia de amadurecer!? Quantos tangos eu fiquei sem bailar!? Quantas canas secas chupadas e por conta da boca ocupada não declamei poemas de amor!? Quantas paixões cozinharam em fogo brando sob meu olhar no termostato da razão, impedindo que virassem brasa!? Quantas noites insones a aranha ficou deitada em teias desfeitas!? Quantos paralelepípedos foram contados nos meus caminhos descaminhados!? Quantos colapsos de solidão tiveram suas medidas conferidas num céu sem estrelas!? Quantos chumaços do algodão conveniente foram gastos para não ouvir os chamados da banda!? Quantas horas minhas retinas perderam sem ver você!!!!????
A banda viu minha vida tão à toa, que me chamou pela última vez pra ver você passar, falando coisas de amor.
A rosa triste que vivia fechada se abriu! Ah! Minha outra banda é você. Contigo fico inteira!
“A moça triste que vivia calada sorriu
A rosa triste que vivia fechada se abriu”
Banda: Chico Buarque