Sem best-seller
Rosa Pena
"Lá fora, amor, uma rosa nasceu, todo mundo sambou, uma estrela caiu...Eu bem que mostrei sorrindo, pela janela, ah que lindo....
(Chico Buarque)
Ele! A capa, a contracapa, o prefácio, o sumário, as páginas do livro que ela não escreveu. Sim, seria ele seu best-seller. O marcador das folhas, o tempo do amor. Na capa o olhar masculino do poema, na contracapa o olhar feminino da poesia. No prefácio, seus deslizes perdoados, no sumário os anos de espera recompensados, nas páginas sem numeração o preenchimento do vazio de braços, finalmente aqueles que abraçam em cada vírgula, o aquecimento de seus dias gelados em pleno verão em cada ponto sem interrogação. O livro que não escreveu, ele, seu best-seller, continua ao lado de sua cama no criado - mudo, talvez mais falante do que ela. As páginas em branco já estão amarelas, bem menos, porém, do que seu sorriso. O livro que ela não escreveu, ele, seu best-seller, está cercado de porta-retratos no criado-cego, de uma história que não é a dela. É outra protagonista. Ela sempre esteve no livro que não escreveu. Por onde andava ele, seu best-seller, que ela não viu? Malditas cortinas nas janelas. Estranha essa loucura dela, que insiste em ler e reler o livro que não escreveu, pois não viveu o conto do encanto (cheio de exclamações).
A vida vivida foi descrita no livro que escreveu no imperativo negativo. Esse descansa no criado-morto.Não foi best-seller.
Apenas mais um nas prateleiras cobertas de poeira. Vendido a preço de ocasião.Ninguém avisou pra ela que o mundo vai bem além das cortinas de sua janela.
( 2006 )