O Ma... o Mada... o Madalena


Rosa Pena




Madalena nunca está contente.
Ela é do tipo que no verão sonha com chocolate quente à beira da lareira e no inverno idealiza uma cerveja estupidamente gelada na praia.
Deixo claro que Mada, apelido da Madalena por causa da música do Ivan Lins, não faz o gênero infeliz, pelo contrário, é muito sorridente e alto astral com os outros. Com ela mesma é extremamente inconstante.
Ela se diz quase feliz no casamento, mas que necessita de um amante urgente:
— Um amante fogoso e romântico vai ocupar o espaço vazio de minha vida. Depois que Luana, minha filhota, casou este espaço que era de uma quitinete virou uma mansão. Tenho certeza de que com um amante serei mais tolerante com o Ferreira (maridão dela), e completaremos bodas de ouro.
Nossa sauna às terças-feiras é terapia de grupo para mulheres que entraram na meia idade e que, se não estão em crise, estão quase. E se não estão nem quase, fazem gênero.
Os principais sintomas da crise são as afirmações, medos e posturas adquiridas em um determinado momento... tipo: “Melhor uma de cinqüenta do que duas de vinte e cinco”; “panela velha é que faz comida boa”; “já aprendemos tudo na cama e não esquecemos nada”. Evitar o espelho logo que se acorda (incrível como o rosto depois dos quarenta sofre metamorfose no decorrer da noite) e nunca sair de casa de cara lavada. Vira essencial pelo menos um batonzinho.
Particularmente, acho que metade da crise seria resolvida quebrando-se espelhos. Aliás, quem foi que descobriu o espelho? Certamente foi um cara de vinte anos, que hoje seria um surfista sarado.
É difícil ser sadia mentalmente, madura e resolvidíssima para se olhar no espelho sem intermediários (batom, blush, botox) perto dos cinqüentinha.
Solteiras, casadas, divorciadas, viúvas, AAA (amada, amante, amiga), todas no período da menopausa, no momento de adeus ao absorvente, sentem um vazio existencial.
Aquele sangue mensal é a prova concreta de juventude. Meus ovários estão com tudo... tá? Meu útero é inteiraço.
A TPM, além de perturbações físicas, é essencialmente um estado emocional. Amamos aquilo que declaramos odiar. Existe prazer em dizer que se está com TPM. Sim, ela é o nosso álibi em relação à terceira idade.
Então, chego à conclusão que ter um amante, quando você tem um casamento satisfatório na cama, quando ainda existe diálogo, quando ainda existe carinho, é um absorvente.
Ele é usado quatro dias ao mês, para acalmar os conflitos, para fazer suportar melhor o peso da existência, para colonizar angústias.
Quando não queremos ou sequer sonhamos em fazer um balanço honesto de nossas vidas, quando não queremos domesticar nossa angústia, convocamos um amante para resolver esta parada. Ele é uma testemunha do nosso vigor, para nós mesmas.
Não que a menopausa tire o vigor. Não mesmo. Acho até que hormônios dão um pique violento.
Acho que é raiva mesmo, de saber bem o que é bom e ter certeza de que não fizemos nem a metade do que poderíamos ter feito. Volto a lembrar o Edu. Paixão malresolvida.
Você que está lendo, está concluindo que estou como a Madalena, incomodada com a idade.
Incomodada ficava a sua avó.
Eu estou é injuriada.




*2002*
livro/ PreTextos

Rosa Pena
Enviado por Rosa Pena em 03/05/2005
Alterado em 03/10/2008
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