Insônia

Rosa Pena

Sou uma orquídea. Estou violácea como ela. Fui perdendo o tom da pele, da voz, da vida. Desde sábado não consigo dormir. Na noite de domingo, depois do Fantástico, imaginei Camille Claudel arrumando os armários e Hilda Furacão apertando melão no horti-frutti. É o que tenho feito já há algum tempo, comprado muita verdura e legume. Abaixo a gordura.

Segunda -feira: Ginástica e depois fiz outra faxina e mais compras. Não usei o micro.
Novamente não dormi. Frontal e Rivotril já viraram balinha de hortelã.
Será que Ana Karenina deixava calcinhas na pia? Maldita insônia que me leva a pensar.

Terça-feira: Caminhei muito e de forma “criativa” fiz novamente compras. Adquiri um vestido na liquidação de inverno que sei que jamais usarei. Simone Signoret deve ter comprado um igual quando descobriu que Yves Montand estava apaixonado por Marylin. Continuei afastada do micro.
Quanto tempo será que um corpo consegue viver sem repouso?

Quarta-feira: Fiz ginástica e fui à inauguração do supermercado Prezunic. A alcatra estava em promoção. A fila parecia “la Traviata”. Tava todo mundo lá, da nobreza a baixa burguesia. Tenho certeza que Violetta furou a fila.

Quinta-feira: Mais criativa ainda parti para as lojas Americanas e vi Clarice Lispector impaciente na fila do caixa. Ela tinha nas mãos a mesma tintura que a minha. Estava em promoção por $ 14,99 e ainda ganhava uma bolsinha de maquiagem. Eu comprei logo duas.

Será que quem idealizou minha morte por insônia foi a Agatha Christie?

Sexta-feira: Talvez seja a hora deu buscar um médico que confirme que sofro de várias doenças modernas, transtornos obsessivos, compulsivos, delírios. Onde fica o consultório do Doutor Drauzio Varella, pois ele sabe a forma correta de se viver. Sempre vivi tão errada, mas eu era feliz.

Agora Coelho, apesar de triste, vou ser uma escritora que vai para a Academia Brasileira de letras. Não bebo, não fumo, não tenho vida sedentária, não como gordura, bebo três litros de água e uso pouquíssimo o computador. Virarei imortal.