Solidariedade Muda

 

Rosa Pena

 

O coração tinha porta, tinha campainha, mas costumava ficar sem tranca. A entrada era fácil, porém não era franca. A campainha tinha que ser acionada, a porta então se abria com facilidade e os convidados podiam visitá-lo com algumas regalias. Ganhariam passe livre? O tempo diria. O preço para a permanência não era alto, era apenas justo.

Bastava demonstrar que gostavam realmente dele e respeitariam os momentos exclusivos que qualquer coração que se preze gosta de ter. Corações adoram privacidade e principalmente verdades.
Percebeu, no entanto, a grande confusão que se faz com esta história de peito aberto. Ter peito escancarado é ter que compartilhar de sentimentos individuais e intransferíveis? Aos pouquinhos resolveu colocar uma chave básica. A porta andava sendo aberta com muita freqüência, sem sequer tocarem a campainha e era pego nu! Coração pelado é privilégio só de quem nem precisa mais bater na porta, já mora nele!

A principio colocou um ferrolho bem vagabundinho. Acreditava que assim os invasores se tocassem que tinham que acionar a campainha. Adiantou muito pouco. Percebeu a insistência, aliás, a incoerência de acharem que alguns “olás” dados de repente, autorizavam a entrada livre.

Ontem comprou um “papaiz” com quatro voltas. Trancou bem para ter certeza que poderia ficar pelado, descabelado, melancólico, maluco se quisesse. Naquele momento quem gostava dele realmente, saberia que ele queria apenas o silêncio do amor, a mudez da solidariedade, o afago da verdade, mas nunca a invasão de “ois” com terceiras intenções, segunda é pouca, do “oba-oba” que não prova caráter, mas faz muito bem ao ego do invasor que passa a se achar um amor de pessoa, mais ainda, companheiro fiel de uma vida inteira, exatamente como aquela paquera adolescente que ficou perto de vinte minutos no peito. 

A partir de agora a cópia da chave seria dada apenas para quem soubesse que amizade não é como celebridade instantânea. É uma construção longa, pedras sobre pedras de atos e atitudes coerentes.

Vontade de chorar sozinho e baixinho de saudades de seu tempo de coraçãozinho estudante. Amigo é coisa pra se guardar, assim falava a canção. Mas certas dores e decepções não foram feitas para terem acompanhantes.
São exclusividades do dono, senão o coração fica chato de tanto reclamar ou vulgar como aqueles dos "obas e olás" que duram tanto quanto aquela paquera durou.

Salve, porém, a eterna esperança que traz novamente uma suave música ao nosso peito! Que venham novos e permaneçam os velhos amigos, mas aqueles de braços abertos, pois mesmo esquecendo a canção, o que importa é ouvir a voz que vem do coração. Ouviu a minha?

Rosa Pena
Enviado por Rosa Pena em 26/06/2008
Alterado em 25/07/2008
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