22/01/2015 12h23
o verdadeiro luxo neste século XXI é conversar sem celulares.

Celular afasta as pessoas e prejudica relacionamentos 

 

Cada vez usamos mais os telefones celulares. Mas ao mesmo tempo eles estão se transformando em um dos principais obstáculos para a comunicação interpessoal. Os celulares nos aproximam dos que estão longe, mas cada vez nos afastam mais dos que estão perto.

É difícil encontrar alguém hoje em dia sem seu telefone celular. As pessoas o levam na mão, como um sexto dedo, ou colado ao ouvido, ou vibrando e tocando no bolso da calça. Quase ninguém quer se separar dele. É como se algo terrível pudesse acontecer se tocar e não responderem.

Todos nos sentimos rejeitados quando, no meio da conversa, alguém prefere atender o telefone em vez de ignorá-lo. A mensagem é clara: quem está longe me importa mais que você. Se você conversa com alguém que não larga o celular, sabe que a qualquer momento poderá ser interrompido. Você vale menos que a próxima ligação.

Estar na presença de um celular significa não estar 100% nesse lugar. Você está, mas sua atenção está dividida.

É o que entenderam perfeitamente no restaurante Eva, em Los Angeles, cujos clientes ganham um desconto de 5% se não usarem o celular durante a refeição. A participação é voluntária, mas, segundo uma reportagem recente do "Huffington Post", quatro em cada dez clientes aceitam a oferta.

Portanto, o verdadeiro luxo neste século 21 é conversar sem celulares. Não fui ao Eva nem sei se a comida e o serviço lá são bons, mas algum dia que pousar em Los Angeles irei ao restaurante como uma espécie de homenagem.

O celular é má companhia. Foi a conclusão a que chegou um estudo da Universidade de Essex, na Inglaterra, que se perguntou em que grau a simples presença de telefones celulares afeta as conversas face a face. Em um dos experimentos, dividiram um grupo de 74 participantes em duplas. A metade das duplas conversou sem um celular à vista e a outra metade, com um celular em uma mesinha lateral. Pediram a todos que conversassem durante dez minutos sobre um fato interessante que tivesse acontecido com eles no mês anterior. Os resultados foram fascinantes.

As duplas que se conheceram sem a presença de um celular relataram maior proximidade e uma melhor qualidade de relação que aquelas que conversaram com um celular à vista. O segundo experimento confirmou que as pessoas têm mais confiança e compartilham mais coisas pessoais quando não há um celular por perto.

Essa é a conclusão do estudo feito por Andrew K. Przybylski e Netta Weinstein, publicado no ano passado em "The Journal of Social and Personal Relationships": "A evidência dos dois experimentos indica que a simples presença de telefones celulares inibe o desenvolvimento da proximidade e confiança interpessoais, e reduz os níveis de empatia e compreensão das duplas".

Isto é, a simples presença de um celular é um obstáculo para a boa comunicação entre duas pessoas. E se a isso acrescentarmos toda a carga informativa e o valor afetivo incluídos em nossos celulares - fotos, telefones, segredos, dados confidenciais, senhas, é claro que é muito difícil nos comunicarmos com alguém em pessoa sem também dar atenção ao pequeno aparelho.

A tendência mundial é uma crescente migração dos computadores e televisores para os celulares. É verdade, não podemos ver vídeos e ler documentos com a mesma facilidade e clareza que em uma tela maior, mas isso é secundário diante da conveniência de ter quase todo o mundo na palma da mão.

Portanto, é absurdo sugerir que não usemos o celular. Não podemos mais viver sem ele. Empresas, governos e famílias dependem dos celulares. Mas sim, podemos definir novos limites. É isso que se depreende dos experimentos feitos em Essex.

Eu já fiz minhas próprias regras. Quando tenho coisas importantes para discutir, prefiro fazê-lo com os celulares em outro lugar. Não faço exercícios com o telefone na mão e passo várias noites apagando os sons do celular. Quando desperto, como exercício contra a dependência, tento não olhar para o celular como primeira atividade matinal. Tento que meu primeiro contato do dia seja com uma pessoa, e não com uma máquina. E posso relatar, com absoluta certeza, que o mundo não acabou e que meus níveis de estresse diminuíram alguns tracinhos.

O celular o apaga. E meu propósito é tê-lo mais tempo apagado ou a uma distância saudável, como fazem alguns sábios clientes do restaurante Eva na Califórnia. Tenho certeza de que a comida lhes parece mais saborosa que para os que têm o celular no ouvido.
 


Publicado por Rosa Pena em 22/01/2015 às 12h23
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