Tarja Branca
Definitivamente preciso crer que Deus existe, é amoroso, faz com que o sol se levante sobre bons e maus e a chuva caia sobre justos e injustos, mas preciso crer também em reencarnação, assim terei uma chance de ser aquilo que todos chamam de são. Desta vez não foi, acho que nem de outras. E vejo nomes desfilarem diante dos meus olhos, num imaginário painel, tipo aquele da Bovespa onde desfilam as ações e sua cotações, e nele aparecem: Viegas, Labes, Maial, Samuel, Clarice, Barone, Urda, Boff, Rosa Pena...E suspiro para só eu ouvir: INVÁLIDOS. Isso mesmo, Gattaca, somos isso nesta sociedade biruta que fez de Baal seu deus. Geneticamente perfeitos são eles, os homens de gravata e as mulheres de tailleur e salto agulha ou quase (prego?). Válidos, perfeitos, sãos, ajustados ao mundo. Nós não. Sanidade? What fuck is this? Imperfeitos seguimos desalinhados, quase doentes. Tristeza, depressão, quilos a mais ou a menos, para de fumar, volta a fumar, porres, tarja preta, bulas e mais bulas, nem farmacêuticos sabem mais do que nós sobre o que é se deve tomar “em caso de incêndio”. E vamos de gastrite, esofagite e, como eu, hérnia de hiato; omeprazol é o melhor amigo do homem. Sobra o que, além do olhar desconfiado e da roupa passada que indica uma certa adequação ou, melhor dizendo, um disfarce para não ser descoberto e internado? Escrever, bem ou mal, certo ou errado, pouco importa. É nossa Tarja Branca, raramente tem efeito colateral, embora haja um inevitável, ou seja, atesta, como uma confissão de crime passional, nosso descompasso com o mundo aí fora. Mas nos resgata e nos deixa mais aliviados, especialmente se a Tarja Branca é uma bula bem escrita sobre tudo e a farmacêutica responsável se chama Rosa Pena. É isso aí, Tarja Branca é o novo livro da Rosa que será lançado no Rio. Por que no Editorial?, perguntam Válidos e Inválidos. Porque eu tive o calafrio de prefaciar e ainda, segundo a autora, foi inspirada em uma das minhas dementes crônicas que ela escolheu o título. Como faltou no prefácio – para o bem dos leitores – tudo o que escrevo agora, faço este Editorial como um jeitão de me redimir com a Rosa, de não ter alcançado no prefácio a altura que ela alcança com sua Pena. E antes que eu estrague tudo: “Seja Herói, Seja Marginal.”
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